RADIAÇÃO E AMEAÇA NUCLEAR


 Radiação Ameaça nuclear

 Atualmente existem mais de quatrocentas usinas nucleares em operação no mundo – a maioria no Reino Unido, EUA, França e Leste europeu. Vazamentos ou explosões nos reatores por falhas em seus sistemas de segurança provocam graves acidentes nucleares. O primeiro deles, na usina russa de Tcheliabínski, em setembro de 1957, contamina cerca de 270 mil pessoas. O mais grave, em Chernobyl, na Ucrânia, em 1986, deixa mais de trinta mortos, centenas de feridos e forma uma nuvem radiativa que se espalha por toda a Europa. O número de pessoas contaminadas é incalculável. No Brasil, um vazamento na Usina de Angra I, no Rio de Janeiro, contamina dois técnicos. Mas o pior acidente com substâncias radiativas registrado no país ocorre em Goiânia, em 1987: o Instituto Goiano de Radioterapia abandona uma cápsula com isótopo de césio-137, usada em equipamento radiológico. Encontrada e aberta por sucateiros, em pouco tempo provoca a morte de quatro pessoas e a contaminação de duzentas. Submarinos nucleares afundados durante a 2a Guerra Mundial também constituem grave ameaça. O mar Báltico é uma das regiões do planeta que mais concentram esse tipo de sucata.

Radiação

A ausência de comunicação imediata de problemas em usinas nucleares preocupa militantes ecológicos e cientistas no mundo inteiro. Isso também acontece no Brasil. Em março de 1993, o grupo Greenpeace denuncia: a paralisação da Usina Nuclear de Angra I, em Angra dos Reis (RJ), provoca um aumento anormal de radiatividade no interior de seu reator. Pressionada, a direção da usina confirma a informação, mas garante que o problema não é preocupante. No caso de Angra, o incidente serviu de alerta para o fato de ainda não se ter estabelecido um plano eficiente para a população abandonar a cidade em caso de acidente grave.

A poluição radiativa tem-se tornado motivo de grande preocupação desde a última guerra mundial, uma vez que seus efeitos podem causar sérios danos às populações vegetais e animais nas diversas regiões da Terra.

Os produtos radiativos podem ser lançados no meio ambiente através de:
- à explosões atômicas;
- à água utilizada para o resfriamento dos reatores de usinas nucleares;
- à detritos atômicos formados nessas usinas.

No rio Colúmbia (Estados Unidos, que recebe os efluentes da usina nuclear da Honfard, constatou-se que a contaminação inicial de uma partícula radiativa na água passava de 35 nos invertebrados aquáticos para 7.500 em patos, atingindo até 200.000 nos ovos das patas, acarretando a esterilização desses ovos.

Poluentes radioativos 

Entre os vários poluentes radiativos, um dos mais perigosos é o estrôncio 90, que, além de apresentar uma meia-vida relativamente alta, é um elemento metabolizado pelo organismo de forma semelhante ao cálcio. (Meia-vida é o intervalo de tempo no qual a metade de um conjunto de átomos radiativos perde a capacidade de emitir radiatividade.)
 
A meia-vida é bastante variável entre os elementos radiativos, como se pode observar nos exemplos abaixo:

- à iodo 131 - 8 dias;
- à iodo 129 - 10 milhões de anos;
- à estrôncio 90 - 28 anos.
 
Como "imitador" do cálcio, o estrôncio 90 - que pode ser adquirido pela ingestão de leite e ovos contaminados - aloja-se nos ossos, próximo à medida. A radiatividade emitida pode alterar a atividade da medula óssea na produção de células sanguíneas, com o perigo de levar o indivíduo a uma forte anemia ou mesmo a adquirir leucemia.
 
O iodo radiativo (I129; I131), outro perigoso poluente, aloja-se em especial na tireóide, reduzindo-lhe a atividade, além de provocar processos de cancerização nessa glândula). Entende-se por que, depois do vazamento da usina nuclear de Chernobyl (na Ucrânia, república da então União Soviética), em abril de 1986, foi proibido o consumo de leite natural e de determinados legumes não só na área diretamente afetada, mas também em países vizinhos, como a Polônia e a Itália. Muitos europeus, para se defenderem da radiação, passaram a ingerir iodo comum juntamente com a água. Essa substância aloja-se na tireoide, "saturando-a" e diminuindo a possibilidade de concentração de iodo radiativo na glândula.
 
O perigo da radiatividade pôde ser tristemente comprovado no Brasil, em setembro de 1987. Uma bomba de césio (equipamento usado para tratamento de câncer), abandonada nas antigas instalações de uma clínica, no centro de Goiânia, foi aberta a golpes de marreta num ferro-velho. A fonte radiativa, uma pequena pastilha, com pó de césio 137, ficou exposta durante vários dias e foi intensamente manuseada, contaminando mais de duzentos pessoas. Cerca de vinte adoeceram gravemente algumas morreram. Muitas áreas da cidade ficaram contaminadas e várias casas tiveram até de ser demolidas.
 
Os elementos radiativos, entretanto, quando bem manipulados, podem ser muito úteis ao homem. Por exemplo, o césio 137 er o cobalto 60 são muito utilizados em tratamento de tumores cancerosos ou em bombas que se prestam à esterilização de insetos nocivos à agricultura.

Chernobyl

O dia 26 de abril de 1986 foi marcado pelo mais grave acidente na história da energia nuclear: a explosão de um reator da central atômica de Chernobyl, situada na Ucrânia (então república da União Soviética), 700 km a sudoeste de Moscou. Centenas de pessoas foram hospitalizadas com intoxicação radiativa, muitas exibiam grandes queimaduras e outros tipos de lesões. Mais de 100.000 pessoas foram retiradas da área da usina, num raio de aproximadamente 30 km. A nuvem radiativa que se formou em consequência do incêndio do reator espalhou-se por grande parte da Europa. Em 1987, um balanço ainda não definitivo das consequências do acidente revelava sua extrema gravidade para o meio ambiente e para a saúde humana. Nos países da Escandinávia, milhares de toneladas de produtos agrícolas tiveram de ser destruídos e milhares de renas foram sacrificadas em função da contaminação radiativa; na Itália, Iugoslávia e Áustria, entre outros países, foram suspensas as vendas de produtos hortigranjeiros, carne e leite das áreas onde os níveis de radiações se mostraram elevados. Estima-se que muitas doenças hereditárias, provocadas por mutações genéticas, atingirão milhares de bebês no futuro. O balanço trágico, portanto, evidencia que o acidente nuclear de Chernobyl deverá ficar perpetuado por várias gerações no patrimônio genético da humanidade.

Tipos de Radiação

Radiação Alfa é uma partícula formada por um átomo de hélio com carga positiva. A distância que uma partícula percorre antes de parar é chamada alcance. Num dado meio, partículas alfa de igual energia têm o mesmo alcance. O alcance das partículas alfa é muito pequeno, o que faz que elas sejam facilmente blindadas. Uma folha fina de alumínio barra completamente um feixe de partículas de 5MeV. A inalação ou ingestão de partículas alfa é muito perigosa.
 
Radiação Beta é também uma partícula, de carga negativa, o elétron. Sua constituição é feita por partículas beta que são emitidas pela maioria dos nuclídeos radioativos naturais ou artificiais e tem maior penetração que as partículas alfa. O 32 P dá uma radiação beta até 1,7 MeV com uma penetração média de 2 a 3 mm na pele, e alcança, em pequena proporção, 8 mm. Se o emissor beta é ingerido, como acontece nos casos de diagnóstico e terapêutica, os efeitos são muito mais extensos.
 
Radiação Gama é uma onda eletromagnética. As substâncias radiativas emitem continuamente calor e têm a capacidade de ionizar o ar e torná-lo condutor de corrente elétrica. São penetrantes e ao atravessarem uma substância chocam-se com suas moléculas. A radiação gama tem seu poder de penetração muito grande. Sua emissão é obtida pela maioria, não totalidade, dos nuclídeos radioativos habitualmente empregados. Quando a fonte de material radioativo for beta ou gama é necessário colocação de uma barreira entre o operador e fonte.

Césio 137

Medo ainda ronda Goiânia

As sequelas deixadas pelo césio 137 não estão apenas nos corpos das vítimas diretas do acidente, que tiveram membros amputados, a pele marcada e a saúde afetada pelo contato com o elemento químico. Passados dez anos do desastre radiológico, boa parte dos goianienses não somente guarda tristes lembranças do episódio como sofre com medo dos efeitos do césio 137. Uma pesquisa realizada entre os dias 19 e 22, das 9 às 21 horas, pela empresa TMK para o jornal O POPULAR revela que 53,6% dos 1,5 mil entrevistados acreditam na possibilidade de que o acidente ainda possa causar algum tipo de risco à população da capital.

Vítimas

Para 42,9% das pessoas questionadas esse risco não existe e 3,5% dos entrevistados não opinaram sobre o assunto. Os pesquisadores abordaram por telefone homens e mulheres maiores de 21 anos, residentes em diversas regiões da cidade. Entre os tinham de 11 a 15 anos de idade na época do desastre, foram feitas 294 entrevistas, que revelaram que 53,1% deles acreditam em riscos do césio 137 e 38,8% não têm qualquer receio quanto a possíveis efeitos tardios do acidente. Vinte e quatro entrevistados - 8,2% do total - não opinaram.

Dos 526 entrevistados com idades entre 26 e 35 anos, 55,1% não esconderam ainda temer os riscos do césio 137. Para 44,9% deles esse risco não existe. Entre os pesquisados na faixa dos 36 aos 50 anos, as opiniões são similares às dos entrevistados em outros grupos: 55,8% temem riscos da radiação, 39,6% não acreditam nessa ameaça e 4,6% não opinaram. Mas, enquanto os mais jovens se preocupam com os efeitos a longo prazo da contaminação, os maiores de 50 anos estão mais tranqüilos quanto a esses riscos. Dos 200 entrevistados nessa faixa de idade, 52% disseram não acreditar na possibilidade de o césio 137 ainda ameaçar a população, 45% acreditam nesse risco e 3% nada declararam.

Para o especialista em medicina nuclear, Alexandre de Oliveira, essa preocupação da sociedade revelada pela pesquisa não se justifica. “O acidente fez muitas vítimas e não deve fazer novas vítimas emocionais”, declara o chefe da assessoria de saúde, segurança e meio ambiente das Indústrias Nucleares do Brasil. Ele garante que não há possibilidade de outras pessoas, além das que tiveram contato direto com o césio 137 em setembro de 1987, sofrerem qualquer doença ou outros efeitos provocados pelo elemento radioativo.

Pesado silêncio da ausência

Há dez anos a casa de Ivo Alves Ferreira e Lourdes das Neves Ferreira vivia cheia de amigos que se divertiam em animados churrascos. Mesmo quando não havia motivos para comemorar, o local era ponto de encontro de parentes e vizinhos e possuía a alegria ruidosa que só as crianças sabem e podem proporcionar. O acidente radiológico com o césio 137 foi o marco divisório na vida dessa e de outras famílias. Há dez anos não acontecem mais churrascos na casa de Ivo e Lourdes. Há dez anos eles deixaram de passear e convivem em casa com um pesado silêncio deixado pela morte da filha caçula, Leide das Neves Ferreira, aos 6 anos de idade.

Impossibilitado de trabalhar por causa das lesões e dos problemas de saúde que se agravaram, Ivo Ferreira continua cercado de amigos. É respeitado e querido na vizinhança. À tarde, sempre aparecem companheiros para conversar, mas não é a mesma coisa. “Não tenho mais vontade de fazer churrascos e, mesmo que quisesse, o dinheiro não é suficiente para esses luxos. Faltaria no final do mês”, explica Lourdes das Neves. Ela procura ocupar o tempo cuidando da netinha que fica sempre com os avós e se recusa a falar no passado, embora as fotos da filha estejam em quase toda a extensão da parede da sala. “Só falo sobre o presente”.

Salgados

As histórias individuais das vítimas do césio se confundem em vários pontos. Passado o frenesi dos primeiros meses de desinformação total, discriminação, baterias de exames, internações em diferentes hospitais e a angústia profunda da impotência diante do desconhecido, elas sofreram o choque do contato com a realidade e, deprimidas, se isolaram. Só o tempo até a decisão de tentar restabelecer uma vida normal variou. Algumas demoraram mais do que as outras, mas todas sabem que ainda não chegaram lá. O estigma, o preconceito, as cicatrizes e as doenças ainda impedem que se sintam cidadãos comuns.

Luiza Odet Mota dos Santos, 38, que sofreu lesões no pescoço, conta que antigamente sentia medo de tudo, principalmente de ser rejeitada. “Quando me perguntavam o que eram essas cicatrizes no meu pescoço, falava que tinha me queimado, mas agora não me importo, falo a verdade, e quem quiser me aceite como sou”, diz, decidida. Luiza Odet procura se manter saudável, preocupa-se com a alimentação e consome muitas frutas e verduras. Sua família foi uma das mais afetadas pela radiação.
Ela, o marido, Kardec Sebastião dos Santos, e quatro dos cinco filhos pertencem ao grupo 1, que corresponde ao mais atingido. Só o filho mais novo, que nasceu em 1992, ficou livre da radiação. Luiza Odet e Kardec trabalham juntos em casa. Fazem salgados, laranjinhas e sorvetes, que vendem no colégio da Vila Santa Luzia, bairro de Aparecida de Goiânia, onde moram. Ela se emociona até hoje e não contém as lágrimas quando lembra do dia 29 de setembro de 1987, quando foi afastada dos filhos. Luiza Odet e Kardec foram para o Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio de Janeiro. A dor da separação dos filhos por três meses foi para ela o golpe mais duro em toda a história de sofrimento desses dez anos.


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