A ORIGEM DA VIDA NA TERRA DEPENDEU DO AMBIENTE

O experimento de Miller e Urey
A característica marcante dos seres vivos é possuir células em sua composição. Bactérias, protozoários, fungos, plantas e animais possuem em comum o fato de que são entidades biológicas constituídas por células, o que sugere que a vida em nosso planeta tenha surgido a partir do momento em que a primeira célula tenha sido originada. Entre as diversas teorias que tentam explicar o surgimento da vida na Terra, a hipótese mais aceita atualmente considera que elementos ambientais tenham se combinado aleatoriamente de modo a formar as primeiras células a partir das quais derivaram todas as outras presentes nos seres vivos atuais.

Muitos biólogos acredita que a vida na Terra tenha surgido há cerca de 3,5 bilhões de anos atrás e se desenvolvido a partir de matéria não-viva, a qual se organizou em agregados moleculares eventualmente capazes de realizar metabolismo e se multiplicar. Até onde sabemos, a vida não surge nos dias de hoje por geração espontânea a partir de material inanimado, porém as condições ambientais na Terra primitiva, quando o planeta tinha apenas um bilhão de anos, eram completamente diferentes. A atmosfera era diferente (com muito pouco O2, por exemplo), e a luminosidade, atividades vulcânicas, bombardeio de meteoritos e radiação ultravioleta eram mais intensos do que se verifica hoje em dia. Dentro desse cenário, os primeiros organismos surgiram por uma evolução química que deve ter seguido as seguintes etapas:

1. Produção abiótica (não-viva) e acúmulo de pequenas moléculas orgânicas, tais como aminoácidos e nucleotídeos.

2. Junção dessas moléculas pequenas, formando moléculas maiores, como proteínas e ácidos nucléicos (DNA e RNA).

3. Aglomeração de grandes moléculas em gotículas, chamadas protobiontes, as quais teriam características químicas diferentes do meio ambiente circundante.

4. Origem da hereditariedade, ou seja, da capacidade de reprodução.

Para compreender mais claramente essa seqüência de eventos, vejamos o processo de um modo mais detalhado. Na década de 1920, o russo Aleksandr Ivanovich Oparin e o britânico John Burton Sanderson Haldane postularam, independentemente, que as condições ambientais na Terra primitiva favoreceram reações químicas que produziram compostos orgânicos a partir de substâncias inorgânicas presentes na atmosfera e mares primitivos. Estes cientistas acreditavam que a atmosfera primitiva era composta principalmente de vapores emitidos por vulcões em grande atividade. Esta atmosfera, extremamente pobre em oxigênio, reuniria condições para que moléculas simples se organizassem e formassem substâncias mais complexas. Para a ocorrência desse tipo de reação, é necessária uma certa dosagem de energia, a qual deve ter sido fornecida principalmente pela radiação ultravioleta que penetrava a atmosfera primitiva. Atualmente, a famosa camada de ozônio nos protege da incidência nociva desse tipo de radiação, entretanto na Terra primitiva não deveria existir esse filtro de ozônio.

Em 1953, Stanley Miller e Harold Urey testaram a hipótese de Oparin-Haldane por intermédio de um experimento de laboratório que simulou as condições ambientais da Terra primitiva. Como resultado desse experimento, obtiveram uma variedade de aminoácidos e outras substâncias orgânicas encontradas nos seres vivos atuais. A atmosfera artificial criada em laboratório por Miller e Urey era composta de vapor d'água, hidrogênio (H2), metano (CH4) e amônia (NH3), os gases que muitos pesquisadores acreditavam prevalecer no mundo primitivo. Estimulados por uma fonte elétrica, esses compostos reagiram e resultaram em substâncias orgânicas correspondentes àquelas citadas por Oparin e Haldane em suas predições. Posteriormente outros pesquisadores realizaram experimentos semelhantes e obtiveram os 20 tipos de aminoácidos encontrados nas proteínas nos organismos, vários açúcares, lipídios e bases nitrogenadas (presentes no DNA e no RNA).

Esses compostos orgânicos mais simples inevitavelmente devem ter se combinado para formar substâncias mais complexas. Por exemplo, sabemos hoje que as proteínas são substâncias formadas pela junção de vários aminoácidos. Em um ambiente primitivo onde existisse uma grande quantidade de aminoácidos formados de acordo com a teoria de Oparin-Haldane e reforçada pelos resultados do experimento de Miller-Urey, a união de vários desses aminoácidos por meio de ligações peptídicas para a formação de proteínas não deve ter sido um evento muito complexo.

A hipótese mais aceita sobre a origem da Terra afirma que nosso planeta, bem como todos os demais planetas do sistema solar, tenham se originado a partir de uma fragmentação do sol. Os vários pedaços resultantes desse fenômeno teriam gradualmente se resfriado, levando à formação das estruturas sólidas dos planetas. Assim, a superfície da Terra a bilhões de anos atrás deveria estar ainda se resfriando. Considerando esta hipótese e os resultados obtidos por Miller e Urey, o norte-americano Sidney Fox submeteu uma solução aquosa de aminoácidos a areia e rocha aquecidas, e obteve ligações peptídicas, que são ligações ocorridas entre os aminoácidos para formarem proteínas. Assim, a formação de substâncias mais complexas, como as proteínas, pode perfeitamente ter ocorrido em um meio ambiente que se resfriava lentamente em tempos primitivos.

A interação entre moléculas de diversas naturezas origina as propriedades da vida. Este tipo de interação é observado nas células atuais encontradas nos seres vivos. No passado, essas interações devem ter ocorrido após a formação dos protobiontes, considerados os precursores das células atuais. Os protobiontes são agregados de moléculas produzidas de modo abiótico (sem vida), aos quais Oparin chamava de coacervados. Eles podem ser produzidos em laboratório quando se chacoalha uma solução de macromoléculas orgânicas (proteínas, polissacarídeos e ácidos nucléicos), de modo a se formar esferas cujo meio interno se isola do externo por uma fina película que permite trocas entre esses dois meios. Alguns protobiontes obtidos em laboratório são envoltos por uma camada de proteína que é seletivamente permeável como uma membrana plasmática celular, e podem até mesmo manifestar excitabilidade de uma forma semelhante ao que ocorre aos nossos neurônios.

Provavelmente os protobiontes formados nos mares da Terra primitiva não possuíam a complexidade de uma célula, porém devem ter adquirido propriedades metabólicas simples, mas suficientes para permitir a modificação de substâncias que entrassem em seu interior através de sua película envolvente. Para que o processo se tornasse completo, estes protobiontes devem ter adquirido a capacidade de se multiplicar, o que deve ter ocorrido por intermédio da atuação dos ácidos nucléicos (DNA e RNA). Assim, de acordo com esta teoria, a vida primitiva seria representada por pequenos aglomerados de substâncias que de algum modo incorporaram informação genética.

Considerando válidos os argumentos aqui expostos, concluímos que a vida deve ter se originado de elementos do meio ambiente, os quais se organizaram em diversos níveis ao longo do tempo e adquiriram características próprias que lhes permitia obter recursos desse mesmo ambiente e transformá-los para seu benefício. Essa dependência do meio ambiente é uma característica comum a qualquer ser vivo existente em nosso planeta nos dias atuais.

As informações obtidas a partir de pistas do passado apontam para essa singularidade dos primeiros seres vivos que possivelmente se originaram de protobiontes existentes nos mares primitivos. Os vestígios mais antigos de vida em nosso planeta, os quais datam de 3,5 bilhões de anos, correspondem a organismos unicelulares procariontes incrustados em rochas. Em outras palavras, esses organismos seriam formados por apenas uma única célula simples, sem núcleo em seu interior. Exemplos de organismos atuais com esse aspecto são as bactérias. Com o passar do tempo, alguns desses organismos procariontes começaram a fabricar oxigênio por fotossíntese (processo que utiliza luz solar para produzir substâncias complexas), o que criou condições ambientais para o surgimento de organismos aeróbicos (que utilizam o oxigênio em seu metabolismo). Estima-se que isso tenha ocorrido há cerca de 2,5 bilhões de anos e fornecido condições para a evolução de organismos mais complexos. Os primeiros fósseis de organismos portadores de estrutura celular mais elaborada, a qual inclui um núcleo em seu interior (organismos eucariontes), datam de 1,7 bilhões de anos, e são também representados por indivíduos unicelulares.

Os indivíduos multicelulares são encontrados em registros paleontológicos apenas a cerca de um bilhão de anos. Estes primeiros organismos formados por aglomerados de células com funções diferenciadas evoluíram posteriormente, originando uma grande variedade de seres, tais como as plantas e os animais. A origem da espécie humana (também multicelular) é um evento que ocorreu muito recentemente na história de nosso planeta. Considerando o conjunto de informações que apresentamos até aqui, podemos afirmar que a vida é um evento contínuo que se estende desde os primeiros organismos surgidos em nosso planeta até à grande variedade de seres vivos atuais. E, conforme destacado anteriormente, a história da vida está intimamente associada à história geológica da Terra. Eventos geológicos que alteraram ambientes mudaram o curso da evolução biológica.

Por outro lado, os seres vivos também afetam o meio ambiente onde vivem, o que pode ser exemplificado pela alteração da composição de gases atmosféricos após o surgimento de organismos fotossintetizantes que passaram a liberar oxigênio. Outro evento que também afetou drasticamente o ambiente terrestre foi a emergência do Homo sapiens, a espécie com o maior potencial devastador de que se tem notícia. Pode-se deduzir, pois, que o surgimento e o desenvolvimento da vida e dos ambientes que formam o nosso planeta foram eventos complementares.

 
Seqüência de eventos que, segundo alguns cientistas, deve ter levado ao surgimento de células simples, as quais posteriormente, ao longo de milhares de anos, teriam se tornado mais complexas e se agrupado para originar organismos multicelulares.

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