Socotra (Socotorá) | A Ilha com Biodiversidade Única

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A isolada Socotra, a 350 quilômetros da costa do Iêmen, abriga uma imensa variedade de plantas e animais inusitados, perfeitamente adaptados a um ambiente agreste, muito quente e fustigado por ventanias.

A Ilha de Socotra está localizada no mar da Arábia, a 350 quilômetros da costa do turbulento Iêmen, do qual faz parte, Socotra foi no passado um local lendário que ficava no extremo dos mapas do mundo então conhecido. Para os marinheiros, era um lugar temível, com baixios traiçoeiros, tempestades ferozes e moradores que tinham a fama de controlar os ventos e de conduzir os barcos às suas praias para que fossem capturados e saqueados. Atualmente, porém, é a rica diversidade biológica de Socotra que atrai novos exploradores, os quais esperam desvendar os segredos locais antes que a ilha seja para sempre alterada pelo mundo moderno.

Estudos realizados no início do século 20 comprovaram que essa ilha tropical, apesar de ter uma área de apenas 134 por 43 quilômetros, está entre os principais centros de biodiversidade do mundo, mesclando elementos da África, Ásia e Europa de maneira que ainda deixa perplexos os biólogos. A quantidade de espécies vegetais endêmicas (que não existem em nenhuma outra parte) por quilômetro quadrado em Socotra e nas três pequenas ilhas adjacentes é a quarta maior entre todos os arquipélagos do planeta – depois das Seychelles, Nova Caledônia e Havaí. Os montes Hajhir, agrestes picos graníticos cuja altitude chega a quase 1500 metros no centro da ilha, abrigam provavelmente a maior densidade de plantas endêmicas em todo o sudoeste da Ásia. Todas as paisagens de Socotra, desde as planícies quentes e secas até os picos encobertos por neblina, exibem maravilhas que não se encontram em nenhum outro lugar do planeta.

Os antigos egípcios, gregos e romanos aproveitaram todos os tesouros do mundo natural de Socotra: resinas aromáticas como o olíbano, o extrato medicinal de aloé e o sangue-de-drago, a seiva rubra do dragoeiro, usada tanto na medicina como corante. As riquezas da ilha eram retiradas por aventureiros, a despeito dos relatos de que era protegida por serpentes gigantes que viviam em suas cavernas. A rainha de Sabá, Alexandre Magno e Marco Polo estavam entre os que cobiçaram as riquezas de Socotra.

O valor do olíbano e do sangue-de-drago alcançou o auge na época do Império Romano. Depois disso, a ilha serviu sobretudo de escala para mercadores, atravessando séculos em relativo isolamento cultural. Os habitantes de Socotra continuaram a viver, geração após geração, tal como os seus antepassados: nas montanhas, os beduínos cuidavam dos rebanhos de cabras; no litoral, vivia-se da pesca; e todos colhiam os frutos das tamareiras. A história da ilha era transmitida por meio da poesia, recitada na língua socotri.

Além de sua posição estratégica diante do Chifre da África, simplesmente não havia nada mais em Socotra que despertasse o interesse do resto do mundo. Mas isto mudou.

Uma outra árvore endêmica, contudo, a dragoeira, tornou-se o símbolo de Socotra – e sua forma característica aparece até mesmo na moeda iêmenita de 20 rials. Parente das plantas domésticas do gênero Dracaena, ela prospera nos planaltos e montanhas em quase toda a ilha. Os maiores bosques de dragoeiras são encontrados em Firmihin, onde passei a noite com Neehah e Metagal. No dia seguinte, sob um sol inclemente, Lisa Banfield e seu colega socotrano, Ahmed Adeeb, me levaram para conhecer a região circundante.

Muitas plantas ali sobrevivem graças à umidade contida na névoa. Algumas das espécies endêmicas mais raras de Socotra crescem em escarpas montanhosas e em todo o perímetro da ilha, onde se impregnam da umidade acumulada quando a neblina se condensa nas rochas. Aqueles galhos de dragoeira voltados para o alto são, na verdade, uma adaptação evolutiva para melhor recolher no ar a preciosa umidade – a qual está se tornando cada vez mais escassa. Se as mudanças climáticas são responsáveis pela precária regeneração das dragoeiras e de outras plantas raras, talvez não haja solução a curto prazo. Enquanto isso, Banfield e outros conservacionistas estão igualmente preocupados com outras ameaças, agora de origem humana, à biodiversidade da ilha.

Até 1999, não havia em Socotra aeroporto de grande porte nem estradas pavimentadas. Desde então, porém, o ritmo de desenvolvimento foi acelerado. Mudanças que em outros locais levaram décadas foram ali concentradas em poucos anos. Com isso, uma quantidade cada vez maior de veículos circula pelo sistema viário em constante ampliação.

Mais de 600 vilarejos, em sua maioria agrupamentos de casas que abrigam famílias extensas, estão distribuídos por toda a ilha, e cada um desses núcleos têm o seu muqaddam, um ancião acatado por todos. No decorrer dos séculos, os socotranos aperfeiçoaram métodos práticos de lidar com as áreas de pastagem, a retirada de madeira, as disputas de terra entre os clãs, o uso da água e outras questões similares. Ao contrário de seus conterrâneos no Iêmen continental, onde são corriqueiras as rixas violentas e as disputas tribais, e onde os homens costumam andar armados e carregando a jambiya (uma adaga cerimonial), os socotranos têm uma tradição de resolver pacificamente as disputas entre vilarejos vizinhos. Somente graças à conservação dos recursos, podem sobreviver no ambiente agreste da ilha, e um dos efeitos colaterais disso foi justamente a preservação da extraordinária biodiversidade local.

As ameaças ao ambiente de Socotra são inúmeras, tanto no nível macro como no micro, embora muitas tenham sido, pelo menos temporariamente, evitadas por questões de segurança. Uma praia lindíssima estava destinada a virar um grande porto, a despeito do fato de que ninguém era capaz de explicar a necessidade de tal instalação. (Quando estive na ilha, uma placa que anunciava as obras fora derrubada pelos moradores, em protesto pela perda de um local tradicional de pesca e recreação.) Nos cafés, os boatos iam desde aqueles aparentemente fundamentados (um iemenita com bons relacionamentos políticos havia adquirido terrenos próximos a uma importante reserva marinha a fim de construir um complexo hoteleiro) até os pouco confiáveis (a construção de uma base militar americana no litoral sudoeste).

Nos montes Hajhir, os velhos costumes parecem tão duradouros quanto os picos de granito. Nos vilarejos rurais, os muqaddams estão de pé ao amanhecer e cantam para as suas cabras, e os moradores continuam frequentando os curandeiros tradicionais, que os queimam para afastar as doenças. A névoa noturna se dissipa com os primeiros raios de sol, os estorninhos-de-socotra disparam por entre os dragoeiros, as pequenas pombas arrulham um gutural rococo, e flores misteriosas desabrocham em encostas que jamais recebem visitas.

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